Inocência de Visconde de Taunay

  • on 11/12/2009
  •   Alfredo Maria Adriano d'Escragnolle Taunay, mais conhecido como Visconde de Taunay(1843-1899) foi um escritor, político e militar brasileiro. Sua obra marca a transição do romantismo para o realismo, sendo um dos maiores nomes do pré-realismo no Brasil. Seus livros tem um caráter nacionalista, comum em obras românticas, e uma descrição detalhada da natureza e das situações, uma das bases do realismo.


    Inocência poderia ser apenas mais uma história de amor aos moldes de Romeu e Julieta. De fato o amor entre Cirino, viajante que finge ser um doutor, e Inocência, jovem mineira casta e submissa, proibida pelo noivado desta com Manecão, típico peão da região, e pela recusa de Pereira, pai da garota e esteriotipo do patriarca interiorano, a aceitar o casal seria irrelevante entre todos os outros contos do Romantismo, apresentando o enfoque no amor trágico, na enaltação da morte como maneira de fuga da dor causado por esse amor trágico, pelo sonho e choque do sonho com a realidade, pela força do jovem, pelo nacionalismo presente tanto na descrição do país quanto no uso de expressões típicas da região, pela natureza sendo usada para se expressar sentimentos tipicamente humanos que o autor quer passar.

    Mas esse livro tem um atrativo a mais, que não está no enredo. Justamente o que falei no primeiro parágrafo, ele ser um livro que faz transição é o que o torna tão interessante. Ele faz um relato detalhado do interior brasileiro. Tanto físico quanto social. Disseca o agreste, nas construções, nos animais(usando do filósofo natural alemão Meyer com sua caça de borboletas para tal). Ao mesmo tempo, seu livro mostra o povo típico da região, machista, conservador(só reparar na expressão anarquizar usada constantemente por Pereira), religioso. Enquanto lia o livro, o título me pareceu ambíguo. Tanto é o nome de uma personagem quanto uma característica intriseca das Gerais. E justamente a inocência, tanto da paisagem quanto dos personagens é posta em xeque quando da chegada de Cirino e Meyer, dois “estrangeiros”, um de nacionalidade que organiza e racionaliza a então selvagem paisagem, o outro de pensamento, Cirino é idealista, sonhador, letrado e mais “liberal” atraindo os sertanejos e a si próprio para a desgraça. Importante lembrar que o Visconde de Taunay participava do Partido Conservador.



    Trecho do livro:

    Nesta mata trazem os troncos das árvores vestígios das grandes enchentes; o terreno é lodacento e enatado; centro de pufetração vegetal donde irradiam os miamas que, por ocasião da retirada das águas, se formam em dias de calor abrasador e sufocante.

    Abundam ali coqueiros de estrípite curto e folhuda cora chamados aucuris, a que rodeiam numerosas lagoinhas de água empoçada e coberta de limo.

    Em nada é, pois, aprazível o aspecto, e a lembrança de que ali imperam as temidas sezões faz que todo o viajante apresse a sua travessia de tão tristonhas paragens.

    Ouve-se a curta distância o ruído do rio que corre largo, claro e com rapidez.

    Como duas verdes orlas refletem-se no espelhado da superfície as elevadas margens, a cujo sopé moitas de sarandis, curvadas pelo esforço das águas e rebalançar contínuo, produzem doce marulho.

    Bem como a ondulação incessante e monótona do oceano agita a alma, assim também aquele perpassar perene, quase silencioso, de uma corrente caudal insensivelmente nos leva a meditar.

    E quando o homem medita, torna-se triste.

    Franca e espontânea é a alegria, como todo o fato repentino da natureza. A tristeza é uma vaga aspiração metafísica, uma elação inquieta e quase dolorosa acima da contingência material.

    Ninguém se prepara para ficar alegre. A melancolia, pelo contrário, aos poucos é que chega como efeito de fenômenos psicológicos a encadear-se uns nos outros.”
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